Fabio Soares Maia
Por iniciativa do Poder Executivo, em 29/08/2023 foi encaminhado à Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 4.173/2023 (“PL 4.173”) que objetiva a tributação da renda auferida por pessoas físicas residentes no País em aplicações financeiras, entidades controladas e trusts situados no exterior.
Trata-se da revisitação do tema abarcado pela Medida Provisória 1.171/2023 que, expirada e ignorada pelo Congresso Nacional, teve seu texto inserido na Medida Provisória 1.172/2023, cuja tramitação, para o tema ora em análise, também não prosperou.
Diante de tal cenário, após os alinhamentos políticos necessários à aprovação de um tema que inova sobremaneira o ambiente tributário brasileiro, o PL 4.173 foi protocolado em regime de tramitação de urgência e com alguns ajustes ao texto inicialmente sugerido nas duas MPs acima citadas.
Em 02/10/2023 foi designado como relator do PL 4.173 o Deputado Federal Pedro Paulo (PSD-RJ) que, no dia seguinte, apresentou um parecer preliminar ao PL 4.173, bem como um Substitutivo ao texto original. Isso demonstra que até mesmo o Governo Federal, por intermédio de sua base política, buscou adaptações ao texto do Projeto de Lei, para deixar o texto “mais palatável”.
Importante destacar o fato do ambiente político nacional favorecer a aprovação do PL 4.173, dada a maioria detida pelo Governo Federal no Congresso Nacional. Do mesmo modo, o cenário internacional também é favorável à aprovação do tema, dado que se trata de assunto que tem sido objeto de regramento relacionado a normas de natureza antielisivas, em especial para países que almejam o ingresso na OCDE[1].
Em 12/10/2023 circulou a notícia de que o PL 4.173 deverá ser votado no dia 17/10/2023, o que torna, mais uma vez, o assunto premente de entendimento pelo público em geral e, em especial, por aqueles que podem ser impactados pelas novas regras de tributação que o Governo Federal pretende instituir.
No que tange ao conteúdo do PL 4.173, a despeito das eventuais alterações que podem ocorrer durante seu processo de aprovação, temos a destacar:
1) Bens situados no exterior e detidos por Pessoas Físicas com residência fiscal no Brasil:
Importante ressaltar os pontos de destaque no texto que já integravam as MP’s anteriormente debatidas, e agora tramitam na forma de projeto de lei, bem como os temas que são verdadeiras novidades nesta nova proposta legislativa.
Quanto aos pontos já anteriormente discutidos, estão:
A pessoa física com renda decorrente de bens e/ou direitos no exterior de até R$ 6 mil por ano estará sujeita à alíquota de 0% do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF). Essa pode ser a situação das pessoas que utilizam contas bancárias estrangeiras remuneradas para arcar com pequenas despesas pessoais no exterior, por exemplo, em viagens internacionais.
A renda entre R$ 6 mil e R$ 50 mil por ano ficará sujeita à tributação pela alíquota de 15% do IRPF, enquanto a renda superior a R$ 50 mil ficará sujeita à alíquota de 22,5%, sendo essa a alíquota máxima já aplicada para aplicações financeiras de curto prazo no Brasil.
Rol de bases de cálculo tributáveis teve incluído como rendimentos do capital aplicado no exterior, os rendimentos de aplicações financeiras (de forma ampla e abrangente, incluindo-se, por exemplo, criptoativos e carteiras digitais; operações de crédito, inclusive de juros decorrentes de mútuo, quando o devedor for domiciliado no exterior e apólices de seguro cujo principal e cujos rendimentos sejam resgatáveis pelo segurado ou pelos seus beneficiários).
Tributação da variação cambial, independente da origem dos investimentos;
Os rendimentos de aplicações financeiras no exterior deverão ser declarados de forma segregada dos demais rendimentos e ganhos de capital auferidos no País na Declaração de Ajuste Anual;
Revogação da isenção do ganho de capital na venda de bens e direitos adquiridos na condição de não-residente.
Em relação às novidades trazidas pelo Projeto de Lei, destacamos:
Possibilidade de compensação de prejuízos de investimentos financeiros de mesma natureza;
Se o valor do prejuízo superar o do ganho, a diferença poderá ser compensada com lucros e dividendos de controlada no exterior, e poderá ser compensado com ganhos auferidos em períodos posteriores;
Isenção da tributação da variação cambial de conta corrente (desde que não remunerada e mantida em instituição financeira autorizada a funcionar no país) e de cartão de débito e crédito;
Possibilidade de compensação do imposto pago em país que tenha firmado tratado com o Brasil ou que haja reciprocidade de tratamento;
O imposto pago no exterior não deduzido no ano-calendário não poderá ser deduzido nos anos-calendários posteriores.
2) Novidades relacionadas à possibilidade de atualizar o valor de bens situados no exterior:
i. O contribuinte poderá atualizar o valor dos bens e direitos situados no exterior para o valor de mercado em 31/12/2023;
ii. Aplicável para: aplicações financeiras; ações e quotas de empresas no exterior; imóveis; veículos, aeronaves, embarcações; e, ativos detidos por trust.
iii.No caso de opção, a tributação incidirá sobre a diferença do valor de mercado na data base 31/12/2023 e o custo de aquisição declarado, mediante aplicação de alíquota de 10%[2] (ou 6%[3]), cujo pagamento deverá ocorrer até 31/05/2024;
iv. A atualização acima poderá ser feita de forma individualizada para cada bem ou direito situado no exterior;
v. O exercício de opção desta atualização de valor de bens e ativos no exterior dependerá de regulamentação pela Receita Federal do Brasil;
vi. Os eventuais ganhos/perdas decorrentes de variação cambial entre o custo de aquisição do direito a receber informado em 31 de dezembro de 2023 e o efetivo recebimento não serão tributados/deduzidos;
Esta possibilidade de atualização dos bens já estava prevista na MP original, mas acabou perdendo objeto com a demora da tramitação do texto à época na Câmara dos Deputados. Entretanto, por se tratar de uma possibilidade de arrecadação rápida para a União, voltou ao texto do Projeto de Lei, desta vez com data-limite até o final do ano.
A grande diferença neste ponto entre a MP e o PL é a possibilidade de que a alíquota aplicada seja de 6%, bem como a não tributação da variação cambial para os bens atualizados, o que é uma grande vantagem para os contribuintes.
De modo geral, as alterações trazidas pelo Projeto de Lei foram bastante pertinentes e atenuam o severo impacto para os contribuintes brasileiros com investimentos no exterior, o que consideramos uma contribuição positiva da Câmara dos Deputados.
Isso não muda o cenário totalmente novo acerca da tributação destes investimentos, como já destacado, o que merece toda a atenção daqueles que possam ser impactados, para não incorrerem em erros e possíveis problemas no planejamento tributário desses investimentos a partir de 2024.
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