A ilusão da “justiça fiscal”: por que a Lei 15.270/2025 representa um risco à segurança jurídica e ao ambiente de negócios
- Braga & Garbelotti
- há 19 minutos
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A recente sanção da Lei 15.270/2025 — derivada do PL 1087/2025 — trouxe à tona um conjunto de mudanças profundas no regime de tributação da renda no Brasil. A narrativa oficial celebra-a como um avanço na justiça social: isenção para quem ganha até R$ 5.000 mensais, redutor para quem ganha até R$ 7.350, e tributação mais pesada sobre “altas rendas”.
Mas, por trás desse discurso, escondem-se vários problemas, tanto para contribuintes quanto para a própria economia. Vejamos:
Principais mudanças da lei
Ampliação da faixa de isenção e benefícios para rendas baixas e médias — quem aufere até R$ 5 mil por mês ficará isento, e há uma redução gradual entre R$ 5.000,01 e R$ 7.350 mensais.
Tributação de lucros e dividendos distribuídos a pessoas físicas: os lucros/dividendos que antes eram isentos passam a sofrer tributação na fonte, com retenção de 10%, quando ultrapassarem R$ 50 mil/mês por sócio.
Tributação mínima anual sobre “altas rendas” (chamada IRPF‑M): se o total de rendimentos (incluindo diversas categorias, não apenas salário ou pró-labore) ultrapassar R$ 600 mil/ano, será aplicada alíquota progressiva até 10%.
Aplicação sobre toda a “renda global”: a base de cálculo engloba não apenas rendimentos tradicionais, mas também rendimentos de natureza diversa — inclusive ganhos de capital, rendimentos isentos, lucros distribuídos etc.
Sob essa estrutura, o governo apresenta a medida como uma redistribuição de renda — os mais ricos pagam mais para aliviar a carga sobre a maioria. E, de fato, em tese, contribuições tributárias maiores sobre lucros e dividendos podem gerar receita e reduzir desigualdades.
Contudo, a lei traz falhas graves que podem gerar insegurança jurídica, distorções contábeis e desestímulo ao investimento, com impactos negativos de longo prazo:
Complexidade e insegurança na aplicação das regras: o cálculo do IRPF‑M exige que todas as categorias de rendimentos sejam consideradas, tributáveis, isentos, provenientes de investimentos etc. Isso aumenta drasticamente a complexidade das declarações e impede previsibilidade: fluxos de renda legítimos podem ser tributados sem aviso prévio, dependendo apenas do somatório anual.
Discórdia contábil e risco para lucro acumulado até 2025: a lei admite que lucros ou dividendos apurados até 2025, mas pagos em 2026/2028, não fiquem sujeitos à tributação, contudo, apesar da atratividade em relação a isenção, trata-se de uma regra que gera insegurança jurídica e pode conflitar com regras contábeis e societárias sobre distribuição de lucros.
Desestímulo ao investimento e ao risco empresarial: tributar lucros e dividendos atinge diretamente sócios e acionistas que investem capital, suporte financeiro da empresa e assumem risco. Isso pode reduzir o apetite por investimento, especialmente em empresas de médio porte, startups ou companhias familiares, fragilizando a base produtiva.
Possível incentivo à elisão e práticas contábeis agressivas: com o novo regime, a alternativa de “retirada disfarçada de lucros” - ou manobras contábeis para evitar tributação — pode se tornar mais atrativa, o que prejudica a transparência e põe em risco a credibilidade fiscal do país.
Política tributária de curto prazo mascarada de justiça social: embora a lei se apresente como uma medida de redistribuição, a tributação de investimentos, principal motor de crescimento econômico, pode comprometer a geração de empregos, inovação e expandir o setor produtivo. Ou seja: o sacrifício de quem produz em nome da “equidade” pode sair muito caro no médio e longo prazo.
Não há dúvida de que o Brasil necessita de políticas que promovam maior justiça fiscal e reduzam desigualdades. Entretanto, a solução não pode consistir em penalizar quem investe, arrisca e empreende, sobretudo quando o ambiente político-econômico já é permeado por instabilidades e incertezas.
A Lei 15.270/2025 parece seguir a lógica simplista de “tributar ricos para beneficiar pobres”, mas falha em considerar os efeitos danosos sobre a segurança jurídica, a atratividade de capital, a governança societária e, sobretudo, a confiança no Estado de Direito.
Se o objetivo fosse, de fato, promover crescimento sustentável com justiça social, seria mais eficaz adotar reformas estruturais: simplificação tributária, desburocratização, incentivos ao investimento produtivo e inovação, fortalecimento da fiscalização contra evasão. Não uma carga adicional sobre dividendos e lucros, que desestimula o capital e penaliza a iniciativa privada.
Diante deste novo panorama, é imperativo que empresários, sócios e investidores revisem sua estrutura societária e adotem planejamento tributário e societário com urgência, revisando contratos sociais, estatutos e acordos de sócios, avaliando a forma de remuneração mais eficiente e considerando alternativas que minimizem os impactos da nova lei.
Se por um lado a Lei 15.270/2025 formaliza mudanças que o governo acaba de sancionar, por outro ela impõe desafios práticos e estruturais que não podem ser ignorados. A inércia, agora, é opção de risco.
João Pedro Don Fernandes
